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Por vezes, no domínio da investigação, começamos por tentar resolver um problema e acabamos por resolver outro. O projeto LungCARD, executado com o apoio das ações Marie Skłodowska-Curie, é um bom exemplo disso.
Inicialmente, o projeto propôs-se desenvolver uma solução de diagnóstico complementar no local de prestação de cuidados para apoiar o tratamento de doentes com cancro do pulmão. «O cancro do pulmão é o tipo de cancro mais comum a nível mundial», afirma Orfeu Flores, CEO da STAB VIDA, a empresa associada coordenadora do projeto.
Segundo Flores, o cancro do pulmão de não pequenas células (CPNPC) representa 75 % de todos os carcinomas pulmonares. «O tipo de tratamento que os doentes recebem depende em grande parte do ensaio de mutação», explica. «Isto significa o rastreio para deteção de biomarcadores específicos no doente, neste caso, mutações do gene EGFR.»
Tradicionalmente, este rastreio é realizado de várias formas, incluindo tecnologias de amplificação do ADN, tais como PCR e LAMP, que detetam a presença de mutações específicas no tumor. O problema com esta abordagem é que requer uma biópsia, sendo que muitos doentes com cancro do pulmão estão demasiado doentes para ser submetidos a este procedimento.
«Ao desenvolver um sistema automático capaz de detetar mutações do EGFR com um simples exame de sangue, conseguimos eliminar a necessidade da biópsia para o teste do EGFR», comenta Flores.
O médico alinha
Embora esta versão inicial do LungCARD se tenha revelado mais apta a detetar os biomarcadores relevantes, ainda havia margem para melhorias. Assim, a equipa da STAB VIDA voltou à mesa de desenho.
Desta vez, o objetivo era transformar o LungCARD num teste completo a realizar no local de prestação de cuidados e apto a detetar rapidamente mutações do EGFR — um recurso que ajudaria os médicos a selecionar com precisão o melhor tratamento para os doentes com CPNPC.
«O resultado deste esforço é o Doctor Vida, um dispositivo portátil que pode ser utilizado a partir de qualquer smartphone», acrescenta Flores.
Quando o Doctor Vida estava na fase de ensaios clínicos para a deteção de EGFR no local de prestação de cuidados, surge a pandemia de COVID-19. «Percebemos rapidamente que a nossa solução tinha potencial para diagnosticar esta nova doença, pelo que mudámos o nosso objetivo», observa Flores.
Hoje, o Doctor Vida Pocket é o dispositivo de PCR portátil mais pequeno do mercado para o diagnóstico da COVID-19. «Trata-se de um kit completo e exclusivo para a recolha e ensaio de amostras que fornece resultados através de uma aplicação móvel em menos de uma hora», diz Flores.
Atualmente, o Doctor Vida Pocket está disponível em todos os continentes, não apenas para a COVID-19, mas também para o diagnóstico da intolerância à lactose, ao glúten, assim como de doenças como o VIH, o VPH e a legionella.
O dispositivo também é utilizado por veterinários para rastreios rápidos e convenientes de doenças em animais, enquanto no Peru, o Centro Internacional da Batata utiliza-o para detetar um vírus da batata.
Do cancro do pulmão à COVID-19
Flores afirma que o projeto consiste num estudo de caso sobre a importância da flexibilidade na investigação. «Começámos com uma tecnologia para orientação terapêutica para o cancro do pulmão e acabámos por utilizar outra tecnologia para diagnosticar a COVID-19», diz Flores.
A equipa da STAB VIDA continua a desenvolver o dispositivo Doctor Vida Pocket, adaptando-o a diferentes tipos de amostras, incluindo sangue e plasma. A empresa também está a trabalhar no LungCARD inicial, concentrando-se na conceção de uma nova estratégia experimental para detetar mutações relevantes associadas ao cancro do pulmão.